sexta-feira, 5 de setembro de 2025

Primeiro a gente entra na estrada, depois a gente acerta a rota

Muita coisa aconteceu comigo desde que entrei no NAME.

Primeiramente, eu tenho uma história profissional de intra-empreendedorismo. Eu sempre tive facilidade em me destacar nas empresas dos outros, auxiliando no seu crescimento, trazendo e implantando novas ideias que facilitavam o trabalho. Por exemplo, na Prefeitura de Porto Alegre, ao perceber que não haveria mais reposição de funcionários efetivos no setor (centenário) onde eu trabalhava e a demanda de serviço era crescente, eu treinei estagiários para executar atividades que eram até então inadmissíveis (por questões culturais) aos adolescentes e, com isso, fomentei o comprometimento deles nas tarefas. 

Isso me permitiu, inclusive, ser uma das primeiras instrutoras da Escola de Gestão Pública da capital. Eu apliquei em outras empresas essa máxima de preparar pessoas para tarefas para as quais elas, em princípio, eram consideradas inaptas. 

Na antiga CEEE, por exemplo, reorganizei o setor de reprografia de materiais didáticos e consegui (com auxílio de pessoas maravilhosas) implantar um apostilário eletrônico, facilitando a confecção e distribuição do conhecimento nos cursos técnicos de desenvolvimento, aperfeiçoamento e formação da companhia. Isso numa época em que o conhecimento era disseminado tirando fotocópia de impressões feitas no tempo do normógrafo (só quem tem mais de 45 anos deve ter ouvido falar). Lá conseguimos também otimizar o espaço físico, gerando mais possibilidade de renda para aquela divisão da empresa. 

Fui responsável pela gestão de serviços administrativos do antigo Núcleo 3 do Sistema FIERGS, reorganizando o controle patrimonial (inventário, baixas, acompanhamento e conscientização dos colaboradores) das unidades do SENAI e SESI de Gravataí, Cachoeirinha, Canoas, Osório, Capão da Canoa e Triunfo, além de fiscalizar os contratos de serviços terceirizados dessas unidades e encaminhar os seguros de vida dos alunos dessas entidades. Ali ficou muito evidente que não bastava trabalhar exaustivamente no operacional se eu não gerasse engajamento das equipes. E nisso os gestores das unidades foram grandes parceiros. Aprendi muito, mas sempre tinha um vazio, porque minha formação era na área da Educação e eu sentia falta disso.

Então eu saí da área corporativa e fui trabalhar com Educação. O que melhorou muito a minha saúde e a minha qualidade de vida, porque eu passei a ter mais leveza e segurança nas minhas ações e ser mais respeitada, afinal eu era habilitada para exercer a profissão. E o fato de eu ter habilitação, gerava em mim um sentimento de segurança. E essa segurança é que me fazia me posicionar de uma maneira mais respeitável. Então percebi que uma formação em coaching me ajudaria a alinhar minha experiência com meu propósito. Além do que me permitiria ter mais uma fonte de renda com liberdade geográfica, já que eu trabalho online. 

Só que, ao mesmo tempo, quando eu era estimulada a empreender para mim - e não para os outros -, eu achava que não era o meu perfil. Primeiro porque eu tinha umas crenças bem negativas sobre empreendedorismo, já que meu pai era empresário e nossa vida era um estresse absurdo dentro de casa por causa dos problemas da empresa. A história do meu vô também era de mágoa dos filhos por conta da mistura dos problemas da empresa e a relação familiar.
E eu não queria que minhas escolhas profissionais virassem o bate-boca nas horas das refeições, sabe. Eu não queria acabar incorrendo no mesmo erro que esses e outros familiares cometeram de misturar as relações de família com as relações de trabalho. 

Então um amigo me deu um empurrãozinho e, de repente, eu estava dentro do prédio da associação comercial de Gravataí (ACIGRA) pra uma reunião do Núcleo de Mulheres Empreendedoras (NAME), que aliás eu fui a primeira a chegar e quase não entrei no prédio. Inclusive, esse era o segundo motivo que eu resistia em empreender para mim. Eu achava (e não estou totalmente curada) que esse lugar não era pra gente que nem eu. Eu achava que aqui era lugar das grandes empresárias, com muitas responsabilidades e muitos compromissos (exatamente como sempre tive na minha carreira profissional - risos).
 

Em 2023 e 2024, eu tive um desafio gigantesco que exigiu de mim muita resiliência e aceitação. Depois de 12 anos, enfim consegui me acertar com os familiares para fazer o inventário dos bens da minha mãe. Nesse ínterim, meu pai, que já apresentava problemas mentais há décadas (e legalmente era capaz) piorou muitíssimo e precisamos interná-lo compulsoriamente. Só quem já passou por esse drama na vida sabe do que eu estou falando. Eu não conto nem a metade do que foi esse período. Foram semanas nos revezando 12X12 horas entre trabalhar e acompanhar o pai na UPA e no hospital lotado. Descansar, meu irmão e eu nem cogitávamos. O diagnóstico era de dependência de cuidados 24h por dia e, em tempo recorde, Deus colocou no nosso caminho as pessoas certas que nos mostraram o lar para idosos onde, olhando em seus olhos com profundo ódio de nós dois, internamos o pai para sempre. 

Então havia, além do trabalho, da casa, do casamento, dos filhos, dos estudos, dos cuidados com o pai, toda uma demanda tanto da gestão e manutenção dos imóveis da família, quanto da ajuda ao meu irmão (sócio do pai) para a organização e destino da empresa deles que estava falida. E lá vai a Cecília aprender também sobre leis e tributos.
No final de 2023, meu querido sogro, bastião da sabedoria em meio ao caos, faleceu - o que me abalou bastante. 

Em 2024, meu pai piorou bastante. Principalmente durante a enchente que assolou o Rio Grande do Sul. A gente pouco conseguia vê-lo, por conta do trânsito inviável da região, visto que ele morava em Viamão, embora conseguíssemos que todos os itens que ele precisava chegassem até ele. Teve internação por pneumonia e lá vamos nós fazer o super revezamento café, trabalho, café, hospital com café, café, trabalho, pagando cuidadoras com dinheiro que nem tínhamos porque estava tudo uma caos e muito pouco gerávamos de renda. Em setembro, outra pneumonia e mais um AVC. Muitas oportunidades profissionais ficaram de lado para novamente fazer essa rotina louca de não dormir, vivendo no café, trabalho, café, hospital com café.
 

Eu já disse que eu gosto de café?
 

Fui muito bem acolhida pelas colegas  do NAME, em especial à coordenação da época, que não mediu esforços pra meu auxiliar, mantendo a visibilidade do meu negócio mesmo quando eu não conseguia ajudar o grupo.
 

Consegui ajudar meu irmão a abrir uma nova empresa e colocar a anterior em inatividade para poder honrar com as dívidas, já que o pai era curatelado em estado terminal. Pai faleceu no final de outubro de 2024, na véspera do aniversário do meu irmão. 
 

A vida não virou um mar de rosas. Porém toda a tempestade que vivi me ensinou a ser mais resiliente e aceitar que nem tudo eu sou obrigada a controlar. 

Perceba que eu não disse "posso" controlar e sim "sou obrigada" a controlar, pois eu vim de uma criação muito exigente. Havia muita expectativa em que eu "desse certo na vida" e eu me sentia na obrigação de não errar. Talvez por isso eu tenha tido tanto medo de entrar no prédio da ACIGRA pra aquela primeira reunião do NAME em 2022. 

Era o jeito antigo de pensar que nunca estava pronta o suficiente pra entrar no circuito. 

Hoje eu sei que primeiro a gente entra na estrada, depois a gente vai acertando a rota.